sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Era uma vez...

Uma garotinha muito esperta, que adorava desenhar. Sua cor favorita era amarelo, mas não qualquer amarelo, tinha que ser reluzente, quase dourado, aquele que brilha com o sol.
Ela gostava também de andar de patins, bicicleta, brincar de boneca, comer bolo, bala, salgado e melado. Detestava acordar cedo, calça comprida, de ficar com medo e de apostar corrida.
Andava de cabelos soltos cheios de cachos douradinhos, da cor que tanto gostava, usando pouca roupa ou nada. Quando via uma piscina, bica, igarapé, bacia... entrava e só saia quando já não podia mais enrugar.
Os anos passaram, a garotinha cresceu, mudou a cor dos cabelos, furou a orelha, fez tatuagem, ganhou e perdeu peso, largou a mamadeira, deixou de andar de bicicleta, parou com as balas, começou a acordar cedo, a usar calça comprida, a ficar com medo.
Mas algumas coisas a garotinha se dava o direito de nunca deixar de fazer. Ainda comia bolo, salgado e melado, sua cor favorita continuava sendo amarelo/ouro, e nunca deixou de desenhar. 
Ela continuou a desenhar, e cada risco lhe levou a conhecer várias pessoas e lugares, aprendeu novas técnicas e até entrou em uma escola onde ela só desenhava. E isso foi o suficiente para sua vida até agora.
Hoje a garotinha não desenha mais, não se sabe quando nem porque, ela simplesmente parou.
Alguns esperam sua volta, outros acreditam que é o fim. Mas no fundo, aqueles que realmente a conhecem sabe que até mais do que a sua cor favorita, 
do que bolo, bala, 
bicicleta e batata frita
ela adora desenhar

terça-feira, 5 de outubro de 2010

A menina que comia dedos


Joana Sena

Doze de Março de 1986, às seis e meia da manhã pesando cinco quilos e seiscentos gramas, em meio a toalhas sujas, algumas abelhas e antes de minha mãe ser depilada, nasci. De acordo com alguns relatos que me foram revelados mais tarde, no mesmo dia abri os olhos que, curiosos, procuravam reconhecer o novo lugar que agora faziam parte.
 Ainda lembro o sumo azedinho que sugava dos fartos seios que me eram ofertados como consolo toda vez que chorava. As horas corriam, enquanto eu, inquieta que sou, sossegava somente quando sentia o primeiro torpor, e assim troncha, murcha, morta de cansaço,[1]desfalecia a espera da próxima mamada.
O tempo passou e com ele a mamadura. Estado de abstinência! Sem aparente motivo de tal maldade. Inúmeras tentativas frustradas e eu também. Tudo estava fora do lugar, ou talvez eu que perdera minha casa.
Somente no Natal de 1990, a agonia fora substituída por tudo que carrego ainda hoje. Foi na manhã do dia 25 de dezembro, ela estava lá, debaixo da arvore enfeitada, como se a me esperar.
Lilica era seu nome, como era delicada. Desde o primeiro momento já pertencia-mos uma a outra. Quando a sós, trocávamos segredos e caricias que não caberia descrever neste breve momento de verdade que vos confidencio.
Tinha por volta de um metro de altura, era branca, cabelos loiros e cacheados, trajava sempre rosa e azul, junto de sua cabeça um chapeuzinho que quando puxado para frente do rosto, descobria na parte outra face, agora masculina. Uma espécie de menino-menina, ou melhor, de menina-menino, juntos dividindo o mesmo corpo.
Divertíamo-nos muito, especialmente no mês de julho quando o tempo parecia conspirar a nosso favor. Durante dias vivemos momentos gloriosos, de plena entrega e torpor. Não existiam regras, muito menos o ridículo conceito de pecado e pudor cravados em meus traumas; apenas liberdade para dançar a musica que os anjos tocavam enquanto Deus envaidecia-se de sua imagem-perfeição.
Lilica apontou-me o caminho dos tijolos dourados e agora qualquer motivo é suficiente para visitar Dorothy[2].



[1] BUARQUE, Chico; Musica Tatuagem, 1986.
[2] O Mágico de OZ. Trecho que fala do caminho dos tijolos dourados, por onde Dorothy (protagonista) passa para continuar sua jornada, e onde encontra seus companheiros de aventura.

segunda-feira, 26 de abril de 2010

Mas tudo bem...

Chegou o grande ano, é agora ou nunca, formatura, pós, e outros planos, que já vinham sendo adiados a tempos.
E ficou difícil colocar neles o teatro, que exige tempo, e infelizmente eu não o tenho, não neste momento.
Como falei antes, este ano é decisivo em minha vida profissional, preciso de um emprego (ganhar dinheiro de algum lado), e só vou conseguir isso estudando muito, e isso exige TEMPO.

TEMPO, TEMPO,TEMPO,TEMPO.

Estou com um buraco enorme, um vazio, que vai me engolindo de pouquinho; ficar longe dos meus amigos, dos diretores, dos ensaios, exercícios e por ultimo e não menos importante, dos palcos... Nossa os palcos, aquela sensação maravilhosa antes de entrar em cena, a alegria que nos comove a cada final de espetáculo e a sensação de dever comprido. Isso tudo infelizmente só poderei viver ao observar meus amigos em cena.
Nossa como isso tudo já faz parte de mim, esta em cada pedacinho do meu corpo, em cada movimento, fala, olhar,... em tudo.
Posso não ser uma grande atriz, ou não ser uma (com todo o direito, os conceitos de valores são individuais), mas amo, de verdade, amo tudo isso.
Deixo aqui um desabafo aflito de uma pessoa saudosa, que sente como uma criança que toma o remédio amargo, mas que sabe que o gosto passa e com ele os males.

É só questão de TEMPO.

Beijos e até a próxima



Joana Sena

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

PRA QUEM GOSTA

Bom, essa postagem é definitivamente pra quem gosta de arte. Primeiramente que nem todo mundo conhece meu blog, prefiro amigo bons críticos do que desconhecidos que não sabem se quer o que falam.
Não! Este carão não vai pra ninguém! E sim! Se vc se ofendeu é pra vc sim!
Sei que não tenho postado muitas coisas em meu blog, e que faz muito tempo desde a ultima postagem, mas vamos pensar um pouco... sou estudante de artes visuais, estou no ultimo ano do curso, TCC, e ainda tem teatro, casa, trabalho, dinheiro (ou a falta que ele faz)... e mais uma série de complicações da vida adulta!
Aff!
Mas esta postagem é para falar que neste final de ano estou muito feliz!
Feliz por conseguir estabilidade, por ter saido da toca (pelo menos a CABEÇA) e caminhar com minhas próprias pernas, isso é muito bom!
Fica aqui então os meus votos de um Bom Natal e um ano melhor ainda!
Beijos a todos

Joana Sena

domingo, 21 de junho de 2009

Metade

E que a força do medo que tenho
Não me impeça de ver o que anseio.
Que a morte de tudo em que acredito
Não me tape os ouvidos e a boca,
Porque metade de mim é o que eu grito
e a outra metade é silêncio.

Que a música que ouço ao longe seja linda,
ainda que triste.
Que a mulher que eu amo
Seja para sempre amada, mesmo que distante.
Porque metade de mim é partida
E a outra metade é saudade.

Que as palavras que falo
não sejam ouvidas como prece
Nem repetidas com fervor,
Apenas respeitadas
Como a única coisa que resta
a um homem inundado de sentimentos,
Porque metade de mim é o que ouço,
Mas a outra metade é o que calo.

Que essa minha vontade de ir embora
Se transforme na calmae na paz que eu mereço.
Que essa tensão que me corrói por dentro
seja um dia recompensada.
Porque metade de mim é o que penso
Mas a outra metade é um vulcão.

Que o medo da solidão se afaste!
Que conviva comigo mesmo
E se transforme ao menos suportável.
Que o espelho reflita em meu rosto
um doce sorriso que me lembro
ter dado na infância.
Porque metade de mim é a lembrança do que fui;
e a outra metade não sei.

Que não seja preciso
mais do que uma simples alegria
para me fazer aquietar o espírito.
E que o teu silêncio me fale cada vez mais.
Porque metade de mim é abrigo,
Mas a outra metade é cansaço.

Que a arte nos aponte uma resposta,
Mesmo que ela não saiba
E que ninguém a tente complicar,
Porque é preciso simplicidade
para fazê-la florescer.
Porque metade de mim é a platéia,
e a outra metade é canção.

E que a minha loucura seja perdoada,
Porque metade de mim é amor
e a outra metade também.
Osvaldo Montenegro